Uma das coisas que aprendi com esta quarentena que já vai para 56 dias é o conceito de liberdade.
A liberdade não é poder fazer aquilo que queremos, mas sentirmo-nos bem mesmo quando nos cortam essa possibilidade.
Nunca imaginei ficar em casa durante quase três meses, a não ser que fosse por doença. Nunca estive confinada em lado nenhum e nunca me senti coartada de decidir o que era melhor para mim ou para os meus.
Houve momentos, porém, em que tive de lutar pela minha liberdade pessoal, já que a dos outros me abafava e se sobrepunha aos meus próprios interesses e necessidades.
Voei para longe a meio da minha vida, naquele Setembro de 2002, já lá vão 18 anos. Nunca me arrependi. Nem quando o meu ex-marido à beira da morte disse à enfermeira com um sorriso: "Dobre a língua, esta não é minha sobrinha, é a minha Mulher ". O caso é mais caricato do que isto, mas poupo-vos os detalhes.
Nesta quarentena compreendi que ninguém é uma ilha e que dependo muito mais dos meus do que julgava. Sem eles não teria aguentado estar tantos dias dentro de quatro paredes, só com uma varanda e um pátio para descontrair. A minha filha é a jóia mais preciosa que tenho e sem ela, a vida seria pardacenta. Dou tudo para a ter aqui com o seu sorriso, os seus silêncios, a sua meditação, as suas fases de guloseimas, as suas pinturas e comentários inteligentes. Com ela aprendi o que é o respeito mútuo, a necessidade de distanciamento, o abraço em alturas mais carentes.
Tenho a felicidade de ter os outros filhos por cá também. E os netos bem perto.
Foi um confinamento relativo, mas que me trouxe muita Luz.
É bom viver. Sem medo do amanhã.
Como estas gaivotas da minha rua, felizes com uns restos de comida que alguém ali deitou. Parecem estar a festejar e a abraçar-se. Sem medo.