segunda-feira, 31 de julho de 2023

O show da Juventude 1963/2023


https://www.freguesiadeguisande.com/2021/12/grandeencontro-da-juventude-abril-de.html

1963

Participei activamente neste evento.  E fácil ver a mentalidade retrógrada dos objectivos que o regeram.

60 anos depois mudei muito a minha opinião sobre a Igreja e a religião católica. Penso que se está a lavar o cérebro dos jovens através da mediatização, do discurso repetitivo, da emoção e até do uso da música. 

Sei o que é. Vivi o na minha adolescência. É giro enquanto dura porque nos empenhamos em algo de bom, colectivamente. Achamos que ser bom é tomar parte em grandes manifestações e festivais, beber e cantar, como se a vida fosse cor de rosa. Só falta irmos todos ver a Barbie com o Papa.

Mas em grande parte, tudo isto é hipócrita e falso, um show off, ostentatorio do poder da Igreja Católica , incensando um homem como todos os outros, com qualidades defeitos,incapaz de mudar o mundo por muito bem que fale e por muitas viagens que faça.

Este poema derrama agua fria neste fogo fatuo.

Poesias

Como se morre de velhice

ou de acidente ou de doença,

morro, Senhor, de indiferença.


Da indiferença deste mundo

onde o que se sente e se pensa

não tem eco, na ausência imensa.


Na ausência, areia movediça

onde se escreve igual sentença

para o que é vencido e o que vença.


Salva-me, Senhor, do horizonte

sem estímulo ou recompensa

onde o amor equivale à ofensa.


De boca amarga e de alma triste

sinto a minha própria presença

num céu de loucura suspensa.


(Já não se morre de velhice

nem de acidente nem de doença,

mas, Senhor, só de indiferença.)


Cecília Meireles


in 'Poemas (1957)'


Saudemos os povos de outras religiões num abraço colectivo e num desejo verdadeiro de união e ajuda mútua. 

Sejamos honestos, proactivos, criadores dum mundo melhor. 

Sem sectarismos .



domingo, 30 de julho de 2023

Sem amanhã

 Acordo sem vontade de me levantar, viver, comunicar. 

Acordo com vontade de continuar a dormir, embrulhada no edredom, acariciando a almofada, no quarto escuro como breu, ignorando o relógio, esquecida das horas, dos outros, do sol lá fora, das flores e da beleza das árvores. Acordo sem vontade de pintar, com asco aos pincéis, às tintas, aos papéis, ao atelier. Acordo sem apetite para nada, ciente de que não vou ver o meu filho mais novo até 6 feira, apesar de serem férias, ciente de que vou estar o mês quase todo sem o resto da família que vai viajar, sem poder ir a praia por falta de forças, farta da monotonia destes dias de verão. 

Acordo com a certeza de que a quimio me vai piorar a neuropatia dos meus pés, o ardor dos lábios e o enjoo habitual se não trouxer outros efeitos piores.



Acordo com vontade de fechar a cortina da vida, acabar já com tudo. 

Sem planos. 

Sem looking forward to. Sem sonhos. Sonhar em quê?

 

Estas JMJ deprimem me. Fogo fátuo. Daqui a 50 anos todos estes jovens serão burgueses instalados, nem á Missa irão. Uma percentagem ter-se á dedicado a causas, mas o mundo cada vez está pior e são gotas de água no oceano.

Não acredito em mais nada, não é o Papa que vai mudar o mundo. Esta adoração duma pessoa irrita me como aos protestantes e outros crentes em religiões onde não há Papas. Ninguém é dono da Igreja. Ninguém tem o direito de gerir os milhões que lhes oferecem. Ninguém é sagrado. E muito menos santo.

Só a Ciência modifica o estado das coisas. Só a Ciência transforma e cura. 

Amo os laboratórios, os frascos, as amostras, as pipetas. Só eles me manterão viva. Confio na minha médica, mas ela não faz milagres.


Amanhã poderei estar viva e optimista. 

Se eu quiser.

quinta-feira, 27 de julho de 2023

Na Casa das magnólias e dos diospiros.

 Gosto muito de ir ao Botânico, como é sabido e devo ter mais de cem fotos lindas desse local místico para Sophia, onde ela escreveu historinhas e poemas jovens.



De vez em quando vou a Casa das Artes, aliás Casa Allen, que fica a 5 minutos a pé da minha casa. É outro lugar sagrado para mim. 



Em Fevereiro a magnólia floresce e só vejo rosa e branco, corolas perfeitas com raminhos negros, enchendo a minha visão de sonho. 



No outono, a cor é vermelha e castanha. Os diospireiros que circundam o lago, incendeiam se num bailado de fogo nunca visto. 



É lá que se pode ver uma das árvores mais velhas do Porto, o tulipeiro, cheio de ramos centenários, onde uma criança se pode sentar e baloiçar as pernas. Os banquinhos de azulejo são óptimos para estar em contemplação naquela sala de visitas, onde gostaria de me casar outra vez. Deve ser lindo.

Fui lá ontem sozinha. Não me atrevi a descer as escadas do jardim, pois não tem corrimão e não estava ninguém para me ajudar. Mas sentei me num rochedo e ali estive. 

As magnólias estão grávidas mais uma vez. Tenho a certeza de que vai haver flores antes da Primavera chegar. 


Oxalá eu também lá chegue.



segunda-feira, 3 de julho de 2023

Memórias dum verão azul

 Eram mesmo verões azuis, aqueles que passavamos nesta bela vila da Luz.

Viemos para cá em 1966 pela primeira vez, tinha eu acabado de encontrar o Manel numa viagem a Suécia. 

Tudo era novo, estava entusiasmada, escrevia lhe cartas apaixonadas, sonhando com passeios aqui a beira mar, sob as falésias, nos carreirinhos cheios de plantas silvestres, nos barcos dos vizinhos...


Era mesmo um sonho de férias, que se  tornou realidade durante anos e anos. Tínhamos um grupo de amigos fixes, cujos pais eram casais exemplares, juntavamo-nos todos os verões, namoriscavamos os mais giros, brincávamos muito e com inocência, que hoje já não existe. 

Era mesmo um mundo ideal, que desapareceu quando os mais jovens começaram a casar e a ter filhos e os mais velhos a falecer. O meu Pai foi dos primeiros e a nossa vida já não era nada do que tinha sido. Depois vieram divórcios, impensáveis nos anos 60.


Fomos muito felizes aqui, embora o meu ex marido não gostasse de praia e se aborrecesse de morte.


Hoje que estou aqui sozinha com a minha Lu, com o Zé a trabalhar em Faro e o resto da família no Porto, sinto a nostalgia do que se passou e pena por não poder reviver o passado.

 Devia agradecer aos céus todos os momentos maravilhosos que me concederam, mas nem sempre consigo.


Ao fim de alguns dias começo a deprimir e a pensar que estamos velhos,  cansados, e um pouco desiludidos. Os meus dois irmãos faleceram este ano e e impossível não os ver nunca mais aqui comigo, todos em família, com um futuro á vista.