quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Por detrás dos montes

Fica Bragança.

Poucas pessoas se atrevem a ir tão longe, sobretudo as que moram a sul. E mesmo as que vivem no Porto, acham mais fácil passear no Minho do que na vizinha província. Mas muitos dos que cá vivem  e trabalham,  nasceram para lá dos montes. E muitos foram para terras estranhas, conservando, no entanto o amor arreigado à terra que os viu nascer.

Para mim, Trás-os-Montes, onde vivi dois anos inteiros, é uma das zonas mais lindas do país, ao lado do Douro vinhateiro, paredes meias com ele.
mirandela

A vista alarga-se por horizontes recortados de montes por detrás dos montes até ao infinito.
Fazer a viagem ao fim da tarde ( das 5 às 8 ) por 12 euros numa camioneta excelente ( excepto a música da rádio foleira) é daqueles bónus que só no nosso país se consegue. Os companheiros de viagem são povo , às vezes um pouco grosseiro, mas é o preço a pagar por tal benesse e faz parte do roteiro cultural. Também ajuda ouvir do iPad, música de Vivaldi e Bach.

Fui a Bragança ontem acompanhada do meu ex-marido e filho para a tomada de posse deste como Juiz.
Ao olhar para ele, sentado no banco da estação a dizer-nos adeus, fez-me lembrar a emoção do  primeiro dia de aulas no Colégio Alemão há 30 anos...será que para nós os filhos continuam a ser meninos eternamente?


Bragança é uma cidade espantosa, deu um salto qualitativo em 40 anos ( quando vivi em Chaves), que nem se consegue descrever. E ainda dizem que o interior não evoluiu!! Note-se que, ontem, ainda não havia estudantes universitários, que são aos milhares, nem estudantes Erasmus, que também vêm em grande número, segundo o meu filho mais velho. A cidade só tinha velhos, quase.

Fiz a viagem de carro para lá e é um regalo para a vista. Os campos, os montes, as serras, todo o ambiente rural nos encanta e atrai. A qualquer hora. Não tirei fotos pois o meu filho ia relativamente depressa e estávamos nervosos para chegar.

Almoçámos numa tasca, cuja comida era divinal: uma posta de vitela assada na brasa, como só os transmontanos sabem fazer....fantástica, mesmo. Depois andámos pela zona do tribunal, uma praça muito bonita, cheia de árvores, cafés, lojas e gente do povo. A estação de camionetas - antiga estação de comboios - fica pertinho , de modo que comprámos o bilhete de regresso logo ali.

A viagem  tem pontos negativos, a começar pelas 3 horas e meia de duração, que são longas, o rádio em altos berros, os desvios da A4 para as cidades mais importantes. Mas a vista das janelas enormes sobre os campos vale o sacrifício, é como se estivéssemos num filme inglês daqueles em que a paisagem é protagonista principal. Os nossos olhos não conseguem desviar-se da beleza que se desenrola durante horas, a uma hora privilegiada. O sol vai enfraquecendo para lá dos montes, mas os contornos dos mesmos vai adquirindo cada vez mais magia. Pelo meio os vales verdes salpicados de casa brancas...

As fotos tiradas por mim são más, mas foi o que consegui da camioneta!!

Vale a pena sair do burgo, conhecer outras terras e a nossa é linda, linda de morrer...

Fica aqui um texto de Miguel Torga, o poeta transmontano por excelência:

A gente entra, e já está no Reino Maravilhoso.
A autoridade emana da força interior que cada qual traz do berço. Dum berço que oficialmente vai de Vila Real a Chaves, de Chaves a Bragança, de Bragança a Miranda, de Miranda a Régua.
Um mundo! Um nunca acabar de terra grossa, fragosa, bravia, que tanto se levanta a pino num ímpeto de subir ao céu, como se afunda nuns abismos de angústia, não se sabe por que telúrica contrição.

Terra-Quente e Terra-Fria. Léguas e léguas de chão raivoso, contorcido, queimado por um sol de fogo ou por um frio de neve. Serras sobrepostas a serras. Montanhas paralelas a montanhas. Nos intervalos, apertados entre os rios de água cristalina, cantantes, a matar a sede de tanta angústia. E de quando em quando, oásis da inquietação que fez tais rugas geológicas, um vale imenso, dum húmus puro, onde a vista descansa da agressão das penedias. Mas novamente o granito protesta. Novamente nos acorda para a força medular de tudo. E são outra vez serras, até perder de vista.











8 comentários:

  1. Virginia, eu faço parte desse grupo de pessoas que ainda não foi para além dos montes. E acredito que tenho perdido muito com isso. As suas fotos e descrições são prova disso. Espero poder colmatar essa lacuna em breve.

    Um beijinho

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  2. Estas fotos não fazem jus à paisagem magnífica que se disfruta mesmo da camioneta. Nunca parei em sítios altos ou miradouros para contemplar. Mas conto voltar, o meu filho vai lá estar este ano todo e desta vez vou mesmo aproveitar para conhecer melhor a região, já que das outras vezes eles estava em sítios sem transporte público quase.
    Bom restpo de semana! Bjinho

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  3. Conheço quase todas as cidades dos distritos em Portugal e outras . Bragança,Guarda e Beja, ainda não. Quanto mais visito terras portuguesas mais admiro as suas belezas que são diferentes de umas para as outras numas poucas centenas de quilómetros. Temos esta particularidade impressionante num território pequeno.
    O Douro Vinhateiro é das paisagens mais lindas que já vi. Dá nó na barriga percorrer aqueles caminhos serpenteados e bastante inclinados dentro de um autocarro, mas compensa!...
    Sim, nos transportes colectivos o que mais custa é quando o motorista resolve colocar musicas que não nos dizem nada ... Já tenho apanhado com estes caramelos . Na última viagem que fiz nestes propósitos foi Porto/ Lisboa e lá tive que gramar com gente que não respeita o seu semelhante, mas pronto, há coisas piores e o melhor é aceitar as adversidades.
    Quero lhe dizer que visito alguns lugares porque o seu blog me dá este incentivo e não me tenho arrependido. Muito pelo contrário! Quando puder vou a Bragança...Beijinhos.

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  4. É tão comovente ler estes seus comentários.Até parece que esta fotos estão boas, mas infelizmente cda vez que olho para elas, me lembro da paisagem magnífica que não consegui captar :) . Mas sim, o nosso pa´si é belo e diversificado. Se se tem a sorte de apanhar tempo correcto ( e não digo só sol, acho que as paisagens ganham muito quando há nuvens e mais dramatismo), podem-se admirar o que os ingleses chamam "breathtaking", de cortar a respiração, sobretudo aqui para o norte, mas também no Alentejo.
    Parabéns pelo casamento da sua filha.....deve ter sido um momento solene para a família..... :)
    Bjinhos

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    1. Mais uma vez obrigada pelos seus votos. Este casamento da minha filha também foi bom para rever a família que está espalhada um pouco por todo o lado. Depois teve a particularidade de ver pessoas , que são amigas da filha e do genro, de várias nacionalidades. Da Rússia, Polónia , Eslovénia, Escócia, Brasil etc. Viver em país diferente dá nisso, cria outras mentalidades mais abertas...Deram cor e mais alegria ao ambiente. Pude observar , mais uma vez,que sabem muito melhor do que os portugueses conviver em sociedade.Ou seja, sabem animar a malta. Nós povo luso somos mais contidos .A lua- de - mel está a ser no Japão... Esta minha filha vive para viajar...

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    2. O casamento do meu filho que viveu sete anos na Alemanha e já andara no Colégio Alemão também foi muito interessante porque havia uns dez amigos estrangeiros de variados sítios.Eles mantiveram tradições como a de fazer um jornal dedicado aos noivos, cartazes com fotos deles quando pequeninos e comentários, canções da escola, etc. Foi animadíssimo. Este ano estou com os netos todos os dias, pois eles acabam as aulas às 4 e vêm para cá. Vai ser engraçado. A empregada deles está em casa até às 6 e eles tb podem ir para casa se quiserem :)

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  5. Vejo que já tens os netos contigo. Que bom.
    Eu, nesse aspeto tenho sido muito privilegiada. Nas férias tive os 4 durante quase 15 dias e depois tive-os separadamente (dois a dois) quase outro tanto tempo.
    E a Luísa também está por cá?
    Nesta semana tenho tido os dois do Nuno que ainda estão sem aulas.
    Gostei muito de ler os teus comentários sobre o meu Nordeste donde cheguei há pouco mais de uma semana e onde estive um mês e meio.
    Temos que combinar uma ida ( especialmente agora que tens lá o teu filho). Já disse isto outras vezes mas a casa que herdámos do meu cunhado tem-nos tomado muito tempo para a pormos minimamente confortável.
    Ab
    Regina

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  6. Só agora li este teu post, peço desculpa, Regina.
    Sim, os meus netos estão cá, o meu filho é que passa quase todo o tempo nos EU, longe da família, coitado. A Luisa tb veio para o Porto e trabalha em traduções.
    Gosto imenso de Trás os Montes, dá-me paz, mas ando com dificuldades em andar a pé, com uma tendinite na anca que me dá dores horriveis. O Zé vem todos os fins de semana, ele está instalado num hotel em Bragança, mas não aos fins de semana. Pode ser que calhe ir lá a meio da semana qualquer dia...
    Bjinhos

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