domingo, 3 de fevereiro de 2013

O campus


Nunca compreendi a gestão das universidades portuguesas no que respeita à vida universitária ou académica, como queiramos chamar-lhe.


Quando comecei a ler livros e a ver filmes e séries sobre as universidades americanas e inglesas, Oxford e Cambridge, a Sorbonne ou outras de alto gabarito,  apaixonei-me pelos relatos dos jovens sobre os eventos em que estavam envolvidos, a chamada vida académica, com todos os seus excessos , mas também com os maravilhosos passeios pelos lawns verdes a perder de vista, as competições, os amores e paixões, o desencanto, as memórias....os professores...e ansiava por sair do liceu e começar vida nova na universidade.

Não encontrei nada disto anos mais tarde, nem recordo momentos apaixonantes na Faculdade de Letras de Lisboa, hoje apelidada de FLUL, um local onde "marrei" durante anos, sempre triste e farta de autocarros, de aulas em anfiteatros, de professores indiferentes, do ensino de massas em vez do cariz personalizado que tanto esperava vir a encontrar no meio académico.

Fiz cinco anos de curso a fio sem qualquer amor à Arte. Lia tudo o que era obrigatório, treze peças de Shakespeare e outros tantos dramaturgos ingleses e americanos, muitas obras alemãs em francês, pois as aulas não ajudavam a que o nosso alemão progredisse o suficiente para conseguirmos abarcar Schiller, Goethe, Lessing, Holderlin, Kafka e outros tantos escritores. O que me valeu foi a colecção Aubier, caríssima, mas com a tradução em francês dum lado e a versão original do outro. Mesmo os romances ingleses e americanos eram lidos por mim em francês da colecção Livres de Poche, que adorava.

Encantei-me pela literatura, mais do que pelas línguas, mal ensinadas por professores - leitores- mal pagos e queixosos.

Resolvi fazer tese de licenciatura, apesar de todos me dizerem que ia ser abolida brevemente. e que os licenciandos passariam a licenciados o que aconteceu efectivamente depois de 1974. Defendi a tese em Agosto de 1971, dois meses antes de entrar para o estágio no Pedro Nunes. Tinha trabalhado quase dois anos no tema - Graham Greene - e abrira os olhos para o mundo numa estadis em Londres, durante um mês e meio, em que trabalhei a sério na Biblioteca da Universidade.

Nunca quis ser professora universitária, embora tivesse notas para isso. Não queria ensinar naqueles edifícios impessoais e dogmáticos, onde não havia espaços verdes, nem ambiente académico. Queria ter alunos interessados.

O liceu chamava por mim, ensinar adolescentes era o meu destino...e foi a eles que dediquei toda a minha vida profissional, de 1971 até 2008, ano em que me aposentei por razões familiares - saúde da minha filha - e cansaço da burocracia e das horas obrigatórias na escola na era de MLR, que quanto a mim, destruiu o pouco encanto que restava na profissão. Adorei a experiência com todos os seus altos e baixos, vitórias e derrotas, momentos sublimes e deprimentes. Vivi a minha profissão com a alma toda.

Hoje passeei durante algum tempo nos jardins da Faculdade de Ciências - antiga FLUP - , que ficam aqui à beira da minha casa. São lindos, tanto no inverno como no Verão, mas nunca se vê vivalma. os meus netos vão para lá andar de bicicleta ou jogar à bola, proibidos no Botânico. As fotos são do meu IPOD que estava sem bateria, ficaram muito más.

Hoje não vi um estudante, um professor, um funcionário.

Este é o espelho da nossa vida universitária. Uma experiência que não se quer repetir e da qual não ficam saudades....

Falo por mim.

4 comentários:

  1. Sim, em Portugal não se presta grande culto à Natureza. E o nosso ensino é muito deficitário nisso como em outras coisas.
    Segundo tenho visto em vários filmes julgo que na Inglaterra e até nos E.U. os professores vivem nos próprios domínios da Universidade.
    A propósito lembro um filme extraordinário que vi há 53 anos(estava grávida da minha segunda filha e por isso não esqueci a data),"Good bye Mr. Chips(será que não me enganei no nome por que era conhecido o professor)" que me deixou tão emocionada que mesmo hoje o recordo com saudades.

    Um abraço.

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  2. Pode ser que no Porto ou em Coimbra e Braga, as coisas sejam diferentes, mas em Lisboa, no meu tempo e agora, não há vida académica de espécie nenhuma, nem cultural nem convívio, nem música, nada. Penso que ainda é assim. os profs tinham todos outras ocupações importantes e passavam pela FLUP para dar as aulas e depressa saíam, sem dar palavra aos alunos. Só n0 5º ano tive seminários, em que o grupo era pequeno e falávamos do nosso trabalho, mas mesmo aí o desinteresse dos profs era enorme. Desisti do 1º seminário e só assiti a parte do 2º para poder ir para Inglaterra onde aprendi mais num mês e meio que num ano inteiro com o meu tutor da FLUP. Fiz a tese toda sozinha pois ele entretanto tinha ido para os EU e só me escreveu uma carta a dizer que gostava muito dela - já depois de escrita!!! E que tivesse cuidado com os erros de ortografia:))).

    Detestei o ambiente, confesso e não tenho nenhumas saudades das colegas, que nunca mais vi.
    O Goodbye Mr Chips é um clássico, muito bom, também vi várias vezes.

    Bjo

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  3. Nunca existiu qualquer campus universitário em Portugal. A que talvez mais se aproxima aos que existem lá fora, é o da católica em Lisboa, mas nada de desporto que faz tão bem... enfim, uma tristeza!

    Gostei muito deste seu post. Não que já não me tivesse dito tudo o que escreveu, mas das conclusões a que chega...

    Beijos (e tem comentári meu no post anterior)
    :)

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  4. Realmente penso sempre nos anos do meu curso com uma certa raiva - nunca com nostalgia - foram anos quase perdidos e não fora ler tanto e obras tão boas, teria mesmo pensado em mudar de vida. Queria ensinar, nunca tive dúvidas sobre isso, mesmo quando fui convidada por uma amiga do meu Pai para ir trabalhar para o ME. A burocracia foi sempre o meu grande inimigo e o ano de estágio um sofrimento, pois fui sempre pessoas de improvisar aulas - embora centrada num objectivo - do que planificá-las até ao mínimo pormenor. Nos anos todos de orientadora procurei que os meus estagiários sentissem que para dar uma boa aula, não é preciso escrever nada antes, é preciso saber a língua e ser competente pedagogicamente, mas não ser escriba ou vidente!!

    Aqui no Porto tentaram fazer um campus na Asprela, há verdes, mas não há vida académica.....:)

    Bjo

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