terça-feira, 1 de outubro de 2013

Faz hoje 50 anos

que perdi o meu Avô materno, tinha eu 17 anos.

Se vos disser que o meu Avô foi talvez a pessoa que mais me influenciou positivamente durante a minha infância e adolescência ( até à idade em que o perdi), não estarei a mentir. Ele era diferente. Ele amava-nos incondicionalmente, via-nos com uma argúcia que quase nos feria e tinha sempre histórias para contar, desde os libretos de ópera com histórias escabrosas que faziam ruborizar a minha Avó até às suas viagens por Paris, onde ia todos os anos no Sud-Exprés.

O meu Avô nasceu em Goa em 1881 e foi médico da Marinha, combatente em África na 1ª GG, para além de inúmeras outras actividades que exerceu como antropólogo, historiador, geógrafo e até inventor. Foi um homem eclético, renascentista, o que não admira, tal a sua paixão pela Itália e a cultura italiana.
Casou aos 35 anos com a minha Avó, filha de uma italiana e dum serbo-croata ( descendente), que ainda era sua prima afastada e que tinha 18 anos. Um romance que durou toda uma vida e que nos deu a nossa Mãe, portadora dos genes de ambos e com uma personalidade que também nos marcou a todos.
O meu Avô era indescritível. Sabia fazer tudo e adorava a vida. Nunca me lembro de o ver deprimido ou triste. Connosco era uma doçura.

Amanhã será lançado um livro escrito pelo meu irmão na Sociedade de Geografia de Lisboa, da qual o meu Avô foi Secretário geral durante vários anos nas década de 50-60. O livro será apresentado pelo Professor Adriano Moreira.
" Júlio- Gonçalves : De Goa a Lisboa" procura reaver dados interessantes da sua vida aventurosa e familiar e será uma extraordinária homenagem a uma pessoa tão importante nas nossas vidas e cujos genes todos herdámos.

Estou muito agradecida ao meu irmão Mário pelo trabalho intenso que teve e a que se dedicou durante anos.

O meu Avô , que nos adorava, nunca soube o quanto gostávamos dele. No seu Diário, que escrevia todos os dias, há frases como esta: "As minhas netas são muito minhas amigas, mas só cá vêm quando lhes dá jeito.". Por vontade dele, estávamos lá sempre.

Mal ele sabia o quanto me custava sair de casa deles depois de almoço para as aulas da tarde no liceu....ou ao sábado, quando nos vinham buscar. E como era maravilhoso ficar com os Avós quando os meus Pais iam de viagem.
Mal ele sabia que hoje, eu ouviria  música clássica com os olhos fechados tal qual ele fazia no seu escritório, depois do almoço ou do jantar.
Mal ele sabia que, durante semanas, senão meses depois da sua morte,  me fecharia no quarto a ouvir música clássica e a chorar.

Felizmente a minha Avó viveu mais 30 anos connosco.  Também era uma pessoa muito especial. Não perdi tudo.

Ficaria aqui a escrever sobre o meu Avô durante horas....mas a memória dói. Dói mesmo muito. Só se sabe quem se perdeu verdadeiramente....muitos anos depois.


8 comentários:

  1. Gostei da sua história, relembrando o seu avô. Pessoas sensíveis recordam os seus antepassados, para outras, passa-lhes ao lado. Meu tio-avô, que nasceu nos anos de seu avô e que, curiosamente, também andou por Africa, como oficial do Exército, também o lembro pelo seu carácter e suas histórias passadas em Africa.
    Meus cumprimentos

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    1. Obrigada pelo seu comentário. Infelizmente ainda há muito jovem que não aprecia os velhos - os seus antecessores, que lhes deram a vida - e desprezam-nos, incitados por esta febre da eterna juventude que domina os media e faz com que as pessoas se sintam mal por envelhecer. O meu Avô só faleceu aos 82 anos, o que nessa altura era longevidade, e deu-nos tanto, tanto que seria difícil enumerar aqui tudo. Tenho orgulho em ter sido sua neta. Cumprimentos.

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  2. Querida avó, ao ler isto senti-me mesmo muito sensibilizado. Tenho a certeza que muita gente sente e sentirá o mesmo. Como eu, também vou um dia desejar que estivesse aqui comigo... Ai, só de pensar nisso já fico deprimido! Por enquanto quero aproveitar ao máximo a companhia das pessoas que ainda estão aqui comigo e dar-lhes muita atenção, prometo! Daqui a pouco vou para aí fazer companhia. Que ainda vivas muitos anos!

    Beijinhos, Piquito

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  3. Meu neto,

    A vida é mesmo isto. Estar com os outros enquanto se vive e fazer por eles o que se pode para os fazer felizes. Um dia lerás tudo isto - se não desaparecer entretanto da net - e ficarás comovido, como eu.
    Obrigada pelo teu comentário, tenho a certeza de que compreendeste bem o que o meu Avô significou para mim. Pena o teu Pai nunca ter conhecido nenhum dos Avôs!
    Bjinhos

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  4. Duas mensagens fabulosas e comoventes, a da avó e a do neto
    Um grande beijinho aos dois
    Regina

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  5. Obrigada, Regina, há alturas em que se sente que o sangue é sem dúvida mais forte que a água....
    Sei que tens na família os mesmos elos de ligação e a certeza das tuas raízes....aquelas que nos fazem andar para a frente e acreditar no futuro.
    Bjinhos

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  6. Eu também adorava o meu avô materno. Era alsaciano, falava mal o Português, mas era imensamente nosso amigo. Infelizmente morreu cedo. Eu tinha doze anos. Mas não o esquecemos. Era dos melhores homens que se podem encontrar na vida. Honesto, trabalhador, bom marido, bom pai, extraordinário avô . Não deixou dinheiro, mas deixou uma profunda saudade.

    Um beijo.

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  7. Só hoje vi este seu comentário, Graciete. Agora compreendo donde vem o seu apelido :)
    Os avôs são muito importantes na nossa vida, em geral têm mais tempo do que os pais e deixam-nos recordações indeléveis. Posso dizer que gostava tanto dos meus avós como dos meus pais por estranho que pareça.....

    Bjinho

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