segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Os ( bloody) testes


Quando eu andava no liceu não se falava de testes a não ser dos psicológicos ou de destreza física.
Nós fazíamos exercícios escritos ( ou pontos) e tínhamos chamadas. Os exercícios eram feitos em 50m impreterivelmente e corrigidos pelo professor na sala de aula, semanas depois, sem grandes demoras, sem perguntas e sem nós percebermos muito bem porque é que tínhamos errado. A correção era feita no caderno diário e os exercícios assinados pelo encarregado de educação ( o meu Pai). Este era o ritual. Por vezes havia testes sem aviso prévio, o que era letal para os pobres alunos.
Para uma selecção séria, todos têm de fazer o mesmo exame: subam àquela árvore!
As chamadas eram orais e regulares, a prof chamava-nos ao quadro ou à secretária e fazia-nos uma série de perguntas em frente à turma. Não sem antes olhar para nós de alto a baixo, a verificar se a bata tinha todos os botões, o cinto e o emblema bem cosido.
Morria de medo nalgumas cadeiras - Física e Matemática, sobretudo, em que não era nenhuma águia…para não dizer que rastejava bem baixinho. Só aprendi a gostar de Matemática no 5º ano quando mudei de professora e participei numa exposição de geometria que adorei. Ainda me lembro de, no 1º ano, acabada de chegar do fino Colégio Inglês para aquele antro formal,  me debulhar em lágrimas para construir os sólidos em cartolina, sem conseguir acertar com os cantos, para gozo dos meus manos, que faziam tudo bem!

No secundário, tudo mudou. Até gostava dos exercícios escritos porque me permitiam exprimir as minhas ideias e escrever, o que sempre foi uma das minhas paixões. Fui sempre uma das melhores alunas a Português, conseguindo tirar um 18 no 7º ano para espanto da minha professora, que achava que o 14 era uma boa nota para mim ;_) : Nunca mais me esqueci do tema da redação do exame: Imagine que Almeida Garrett vai almoçar com o seu amigo Alexandre Herculano na quinta de Vale de Lobos e descreva a cena. Pode usar diálogo!

Hoje em dia não há exercícios nem chamadas, mas há  testes de diagnóstico, formativos, sumativos ( e pouco apelativos para rimar). O professor tem de elaborar o teste segundo uma matriz pre-concebida com critérios de correção pormenorizadíssimos ( se faltar uma vírgula, é irrelevante; se faltar um acento desconta-se 1/2 ponto; se der erro de ortografia pode ser irrelevante ou descontar 1 ponto, tudo depende do tipo de questão). As questões são depois todas incluídas nos descritores, divididos em 5 categorias - 1-5, sendo que 5 é para as respostas mais complexas e 1 para as mais carentes :).
- Então você vem do ensino público, o que é que o sistema oferece de positivo?    Isso é uma pergunta de escolha múltipla, um verdadeiro -falso ou um completamento de espaços???-

Ah, e ainda falta a grelha de correção que se oferece aos profs já com as cotações todas colocadas nos seus devidos sítios para não haver enganos.
Alguns profs ainda fazem gráficos….mas isso não compete aos autores. Aliás, só faltava mais essa e, já agora, corrigirmos os testes dos alunos.

Tudo isto me faz uma enorme confusão. Não consigo pactuar com o eduquês ( que o nosso amigo Crato tanto censurou), nem com estas burocracias que dão cabo do trabalho pedagógico e dos miolos dum professor, tiram-lhes horas de sono ou de lazer, obrigam-no a tarefas inglórias e inúteis. Para quê?

Os editores adoram este circo. Quanto mais papelada melhor, mais caderninhos, mais agendas, mais boletins, mais livros para ajudar os menos aptos, mais páginas e páginas a render milhões de cada vez que se lança um projeto. Já não se trata dum manual único mas duma panóplia de recursos didáticos ( gostam?), que o professor e os alunos deixam em casa na maioria dos casos. E ainda temos os suportes eletrónicos, os CDs interativos, que contém Powerpoints, manual interativo, os ditos testes, ditados gravados em webinars, grelhas, fichas para alunos heterogéneos, etc. A apresentação dos projetos faz-se em hoteis de cinco estrelas, onde os professores se sentem homenageados e reconhecidos :))

Pergunto-me:
Conseguiram ler isto TUDO?  Perceberam? Ou ficaram confusos??

Se leram tudo têm 20 VALORES, mesmo que não tenham percebido ( mas só se os vossos comentários obedecerem ao acordo ortográfico. Os erros são relevantes neste blogue!!!)

10 comentários:

  1. Ando muito cansada para compreender esta complicação em que o Crato meteu os professores e o e ensino, enxovalhando uns e destruindo o outro. Eu tive alguma sorte, quando professora no ativo, pois venho de um grau de ensino onde tinha uma certa autonomia.
    Mas considero que tem que haver formação e atualização dos professores,nunca da maneira que o Crato impõe. E acho também que o ensino, assim como a saúde, são direitos essenciais e portanto públicos e não objeto de negócio.
    Um beijo.

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  2. Tem toda a razão. Contra mim falo. Comecei a fazer manuais sem a minima noção dos ganhos ou do valor económico que representavam. Durante anos trabalhei que nem uma louca, cheguei a fazer tres manuais num ano e ganhei bastante dinheiro, mas nunca me expuz em sessões ou encontros de marketing. Fiz mais de 50 sessões para professores, mas sempre para formação dos mesmos e nunca com base em publicidade ou propaganda dos meus manuais. E nunca ganhei um tostão nessas sessões - quanto muito um ramo de flores ou uns chocolates. Por vezes até ia de camioneta aos locais pois nunca conduzi. Desde que começaram os encontros de educação que ,e tenho manifestado contra, mas as colegas adoravam as sessões e diziam que contribuíam para conhecer melhor os materiais com que trabalhavam. Nunca vi ninguém queixar-se, ainda no ano passado, estavam 200 pessoas inscritas em Lisboa. Recusei-me a fazer sessões este ano e arranjei uma colega que as fará a troco de dinheiro, é claro. Ela gosta, eu não!!

    O que me revolta é as chinesices que inventam todos os anos e que complicam a vida aos autores e aos professores….o Estado não tem dinheiro para oferecer os livros aos alunos, mas as escolas só não organizam trocas de livros duns anos para os outros porque não querem. No Colégio Alemão isso faz-se com naturalidade.

    Bjo

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  3. Gostei da ironia do seu "discurso".
    Como eu a compreendo :=)
    Bjs. Maria Eugénia

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  4. Agora já posso expressar o que sinto publicamente e muitas vezes expressei na editora. Mas a competição é feroz, Geninha, não há jeito a dar, caminhamos para a comercialização da educação cada vez mais. Só que eu vou retirar-me enquanto é tempo. Bjinhos

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  5. Li tudo. Percebi e não fiquei confusa. Ou por outra, confusão faz-me o facto de se sujeitar os professores e os autores a esta violência (creio ser o termo certo), transformando o ensino num negócio (bem) mal amanhado (embora dê muito dinheiro às editoras). Enfim, tenho pena que os alunos de hoje não tenham hipotese de ter um ensino como a tia e eu tivemos. Eramos todos mais felizes, alunos, professores e autores!

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  6. Engraçado vires aqui ao blogue....
    Há tanto tempo, Deus meu que ninguém da família escreve aqui!! Até esfreguei os olhos a ver se eras mesmo tu :) Ainda bem.
    Tens razão e é por isso que este projeto é o meu canto do cisne. Ainda estou rodeada de provas aqui por todos os lados, mas esta fase já é mais repousante :)
    O teu neto está uma maravilha....tem uns olhos espantosos, falo ideia do mimo que ele tem, mas é bom assim....:) Tb mimo os meus quando posso e eles deixam!!
    Bjinhos

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  7. Tia, venho aqui todos os dias ler o que escreve, gosto muito deste blog :) Sei que raramente comento mas é apenas pq me faltam as letras e não por outra razão qualquer :)) Beijinhos.

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  8. É bom saber que tambem a família se sente bem com o que escrevo, embora não esteja a escrever para eles :)

    Obrigada. Bjinhos ao Pai e meninos!

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