quarta-feira, 2 de julho de 2014

Sophia

Conheci Sophia desde sempre. Li obras dela na escola e depois, durante muito tempo, quase a esqueci. O meu ex-, que lia muito e até escreve poesia, não apreciava a sua obra, os meus filhos não se encantaram pelas histórias que foram obrigados a ler no colégio.

Só a redescobri quando vim viver para o Campo Alegre, "paredes meias" com as casas onde Sophia viveu a sua juventude.

Ao ler " O Mundo a minha Procura" de seu primo Ruben A, consegui descobrir o encanto do mundo privilegiado em que ambos os escritores foram criados e que tanto influenciou as suas carreiras literárias e até a sua vida mais íntima.

Não sou uma apaixonada da poesia de Sophia, mas gosto muito de alguns poemas. Não me seduzem as histórias da "menina do mar", que me parece uma imitação pobre de St Exupéry e do "rapaz de bronze "- Nem o Conto da Floresta me apaixona.
Acho-as um pouco delico-doces e escritas para imitar o pensamento infantil. O que me seduz nelas é a evocação do mar da Granja ou do jardim do campo alegre, em que ela se inspirou para as escrever. Gosto, sobretudo, do que ela escreve na 1ª pessoa, pois identifico-me com muitas das suas ideias e , sobretudo, gostos.

Eu morreria de novo se fosse transladada para um panteão anos após ter sido enterrada na terra. Não havia testamento vital no tempo de Sophia, mas aposto que ela não quereria ficar num mausoléu, longe de tudo e sobretudo, longe das suas raízes e do seu mar.

Acho que esta decisão unânime foi errada, mas creio que Sophia já não sentirá claustrofobia naquele antro de mármore.
A sua alma já voou há muito para além deste mundo de politiquices e honras plebeias.

No fundo do mar ou a beijar as estrelas, Sophia já não mora aqui.



AquiAqui, deposta enfim a minha imagem, 
Tudo o que é jogo e tudo o que é passagem, 
No interior das coisas canto nua. 

Aqui livre sou eu — eco da lua 
E dos jardins, os gestos recebidos 
E o tumulto dos gestos pressentidos, 
Aqui sou eu em tudo quanto amei. 

Não por aquilo que só atravessei, 
Não pelo meu rumor que só perdi, 
Não pelos incertos actos que vivi, 

Mas por tudo de quanto ressoei 
E em cujo amor de amor me eternizei. 

Sophia de Mello Breyner Andresen, in 'Dia do Mar'

10 comentários:

  1. Virgininhamiga

    Tive o privilégio (e a honra) de ter conhecido Sophia e com ela ter umas conversas. Jornalista é assim: cava, cava, cava e alcança o objectivo. Depois de a conhecer pessoalmente comecei a entender melhor a sua poesia. Como sabes sou mais de prosa; mas, descobrindo o atalho por onde se chega ao poema, este surge-nos diferente, por vezes etéreo, mas sempre diferente. Foi isso que me atraiu para a poesia dela. Que, muitas vezes, ainda tento descobrir...

    Qjs (e da Raquel também)

    ResponderEliminar
  2. Li o que escreveste no blogue da Helena. Sim, tu privaste com muita gente famosa e foste um privilegiado nesse mundo!! Só conheci Sophia quando fui às raízes e aqui onde vivo respiro-a! O jardim onde ela cresceu e correu fica em frente da minha casa e muitas vezes me sento no jardim de buxos onde está a estátua de bronze dela - esta que vês aqui - e procuro compreender a essência daquilo que ela escreve. Muito obrigada por estares aqui.

    Um beijo grande para os dois

    ResponderEliminar
  3. A ler, a ler, a ler e a reler. Sempre.
    Da mais profunda Grécia ao encanto do mar. Tem muito a ver consigo, Virgínia.
    Boa recordação.
    Bjs

    ResponderEliminar
  4. Sim, identifico-me bastante com os seus gostos....leio e releio sempre que a visito no seu jardim ( que não é o mausoléu no Panteão). Sento-me num banco e olho-a, rodeada de flores lindissimas....é aqui a casa dela....
    Bjos

    ResponderEliminar
  5. Eu, pessoalmente, gosto muito de ler Sophia. Contrariamente à Virgínia, gosto muito dos seus livros infantis. Lembro-me de, ainda criança,esperar ansiosamente que uma Professora faltasse, para ir a correr à Biblioteca, continuar a leitura dos seus livros. Lembrar estes momentos, faz-me bem, faz-me feliz :-)
    Bjos. Maria Eugénia

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não li nada dela antes dos meus 15 anos e nessa altura já não achava graça às histórias de encantar... ( O Principezinho é uma excepção). Nem sequer gostava muito dos filmes de Disney que só comecei a gostar já adulta!! Preferia a Condessa de Segur e os Cinco!!
      Mas compreendo que haja quem aprecie Sophia e o seu mundo infantil. E é bom ter essas recordações!Bjinhos

      Eliminar
  6. Gosto da poesia da Sofia. Quanto ao lugar em que repousa não me manifesto porque acho mesmo que o importante é divulgar e não deixar esquecer a sua obra.

    Um beijo.

    ResponderEliminar
  7. Não acredito que se tivesse tido voto na matéria Sphia quizesse ir para o Panteão. Apenas foi vítima da portuguesisse manhosa, da politiquisse sebenta, do oportunismo bacoco de quem, infelizmente, está na fila da frente deste País.
    Mas a Poesia e a Prosa de Sophia transcendem estes actos e actores de segunda e, como a Virgínia muitto bem diz, está mais viva no jardim da sua casa e nos escritos que nos deixou.

    ResponderEliminar
  8. Bastava ver as personalidades que se juntaram nesse evento para perceber o alcance de tal decisão. Nem os filhos todos concordaram...o vaidozote do Miguel estava feliz, logicamente e espera com o seu Equador chegar ao topo!! Não me convencem de que Sophia seria a primeira a escolher o Panteão para ser sepultada....ela adorava a liberdade, o espaço, respirar....

    Até amanhã!!:)

    ResponderEliminar